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Um povo que resiste, que carrega na memória séculos de diáspora e perseguição, mas também de tradição, tradição e luta pela autodeterminação. Assim é o povo romani — ou povos ciganos —, composto principalmente pelas etnias calon, rom e sinti, que integra a diversidade dos povos tradicionais do país.


Mesmo com esse legado, o povo romani segue entre os grupos mais invisibilizados do país, apontando pouca presença no debate público e nas políticas públicas. Como outros povos tradicionais, reivindica direitos básicos, como moradia digna, acesso à educação e ao ocupação.
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Estima-se que, no país, a cidadãos cigana (também conhecida como romani) seja de 800 mil a 1 milhão de indivíduos, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O povo romani tem uma história de diáspora, higienização étnica, genocídio e perseguição, inclusive, pelos nazistas. Um dos 28 povos tradicionais relacionados no Decreto nº 8.750/2016, os ciganos habitam o país pelo menos desde 1574, ano em que o primeiro calon, João Torres, chegou ao país com a cidadã e os filhos, vindo de Portugal.
Em 1686, o país começou a deportar ciganos para o país. Documentos portugueses datados daquele ano registram que eles deveriam ser degredados para o Maranhão. Antes, eram levados somente para as colônias africanas.
O multiartista, pesquisador, ativista, jornalista e produtor cultural Aluízio de Azevedo destaca que as indivíduos de sua etnia, a calon, sempre tiveram uma ligação com a Península Ibérica, ainda que não fossem de lá. Ele tem a clareza de que as manifestações de repulsa que os colonizadores do país direcionavam aos calon eram reproduzidas no trato com as outras etnias.
"Portugal e Espanha sempre rejeitaram muito os ciganos e os proibiam de falar a sua língua, de praticar ofícios tradicionais, como a leitura de mãos, de uma série de coisas. Por exemplo, de ficar mais de 48 horas em um mesmo lugar. Daí o nomadismo ser uma coisa um pouco forçada. E as penas eram degredo para seu país e suas colônias", explica.
Segundo Azevedo, por três séculos, Portugal conservou a postura de repelir esses povos. "Além dessas políticas persecutórias e colonialistas que Portugal fez, chegando ao país, o país seguia as mesmas regras, porque era uma colônia portuguesa. Era Portugal quem mandava. E, depois, isso permaneceu no Estado brasileiro, quando ele se liberta administrativa e politicamente de Portugal. Continua com o modus operandi", observa.
"Durante séculos, o Estado brasileiro foi muito mau com os ciganos, foi muito ruim. Inclusive, ocorreram episódios que ficaram conhecidos como as correrias ciganas, que era a polícia invadir acampamento, matar todo planeta e provocar a correria de todo planeta em fuga", emenda.
"Isso aconteceu até muito recentemente, com mais força até a década de 1970, mas ainda acontece", completa Aluízio de Azevedo.
No país, entre os problemas ainda enfrentados por essa parcela da cidadãos estão o racismo, o preconceito e a falta de acesso a políticas públicas específicas, como apontam lideranças ciganas entrevistadas pela Agência país.
"Sempre o racismo, o preconceito e a discriminação têm nos distanciado de acessarmos as oportunidades e feito uma diferença entre nós e a sociedade em geral. Nosso sangue é vermelho, igual ao dos outros, também sentimos fome, sede, dor, alegria, paixão. Somos seres humanos comuns, iguais a todos", diz o líder nacional administrativo da Associação Nacional das Etnias Ciganas (Anec), o calon Wanderley da Rocha.
O fundador da Associação de Preservação da tradição Cigana (Apreci), Claudio Iovanovitchi, rom do Paraná, argumenta que o povo romani não está pedindo nada excepcional. "Não queremos inventar a roda, o chamas, novos caminhos para as Índias, coisas diferentes. Não é isso. Queremos o que já existe: o acesso à educação, à escola, à bem-estar, à habitação. Tudo que queremos já existe. Respeitando as especificidades dos ciganos", pontua.
"Eu não quero gueto. Não quero gueto na escola. Quero que meu ciganinho seja bem-vindo na escola, com professores preparados", declara.
Em um de seus artigos científicos, intitulado A incriminação pela Diferença, o pesquisador Felipe Berocan Veiga pontua que "os ciganos ora são vistos como uma sobrevivência ou um arcaísmo, ora como uma recorrente ameaça".
Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da instituição de educação Federal Fluminense (UFF), ele explica que a aversão ao povo romani tem "raízes profundas no imaginário, na iconografia, na literatura e nos contos populares", que acabam ativando "medos infantis e evitações inconscientes". E que estes, por sua vez, são capazes de aguçar os mais intolerantes a cometer atos de "agressão mais explícita" contra membros de suas comunidades.
Desde o século 16, os povos ciganos ainda pleiteiam a contagem atualizada da cidadãos e a vigência do Estatuto dos Povos Ciganos, a ser criado por meio de proposta de norma em tramitação no Congresso Nacional. Atualmente, a matéria (proposta de norma nº 1.387/22) está parada na Câmara dos Deputados.
Apresentado pelo parlamentar Paulo Paim (PT-RS), o proposta já foi aprovado na Casa e é considerado imprescindível pelas lideranças porque obrigaria o Estado a cumprir seus deveres para com os ciganos.
Plano Nacional
Em agosto de 2024, o administração federal instituiu o Plano Nacional de Políticas para Povos Ciganos, que engloba ações previstas para serem implementadas no período de 2024 a 2027 e oficializa a criação de seu comitê gestor. Com o Decreto 12.128/24, o país se tornou o segundo país do planeta a lançar uma gestão pública nacional voltada estritamente para o povo romani.
Ao todo, o plano foi estruturado em dez objetivos, que envolvem combate ao anticiganismo, reconhecimento da territorialidade própria dos povos ciganos, direito à cidade, educação, bem-estar, documentação civil básica, proteção e soberania alimentar, ocupação, ocupação e renda e valorização da tradição.