

A avaliação é de professores e especialistas em comunicação que avaliaram a importância da Agência país na cobertura internacional em meio ao aumento das tensões geopolíticas no planeta.
Notícias relacionadas:
- Anistia Internacional: efeito Trump coloca em risco bilhões de indivíduos.
- Pesquisador critica cobertura latino-americana sobre conflito em Gaza.
Para os analistas, o papel da mídia pública nacional é reportar os acontecimentos globais sob o ponto de vista do país enquanto um país da periferia do sistema global, também chamado de Sul Global.
O educador André Buonani Pasti, que investigação agências de notícias internacionais, ressalta que as principais empresas jornalísticas do planeta mantêm vínculos com os Estados a que pertencem.
“A gente está falando de interesses geopolíticos vinculados aos Estados a quais essas empresas pertencem. Esses empresários são mobilizados nos momentos de contexto político tenso que movimentam o cenário internacional e estão conectados diretamente com alguns Estados-nação”, diz o educador da instituição de educação Federal do ABC (UFABC).
Pasti cita, por exemplo, a cobertura “amplamente pró-Israel, no conflito Israel-Palestina, assim como uma cobertura quase de propaganda da Guerra da Ucrânia. Isso não ajuda a informar. É um questão”.
Essa avaliação é reforçada pelo jornalista brasileiro Matias M. Molina, em seu livro Os Melhores Jornais Do planeta, no qual destaca o papel dos principais jornais dos Estados Unidos (EUA) - como o New York Times e o The Washington Post - no apoio às guerras do Vietnã e do Iraque. Segundo ele, esses periódicos reproduziram a visão oficial da Casa Branca, inclusive sustentando a falsa acusação de que o Iraque mantinha armas de destruição em massa.
>> Siga o canal da Agência país no WhatsApp
Jornalismo empresarial
O educador de jornalismo da Pontifícia instituição de educação Católica de São Paulo (PUC-SP) José Arbex Junior avalia que a cobertura internacional da mídia empresarial do país utiliza as “lentes” das principais agências estrangeiras de notícias, em especial, dos Estados Unidos e da Europa.
“Com essas lentes, eu, como brasileiro, estou olhando o planeta de uma forma completamente distorcida porque uso óculos que não servem para mim. O que eu, como brasileiro, tenho que entender sobre o planeta? Essa é a questão central colocada do ponto de vista de uma cobertura internacional”, destacou.
O educador de jornalismo da instituição de educação Estadual de Ponta Grossa (UEPG) Ivan Bomfim destacou que o jornalismo não é neutro e que ele vem carregado de valores construídos a partir de compreensões de planeta das empresas que o patrocinam.
“Nossa visão do planeta acaba sendo moldada pela mídia empresarial a partir do que vem das agências estrangeiras. É claro que esse material é retrabalhado nas empresas brasileiras. Só que esse conteúdo informativo é retrabalhado a partir de interesses econômicos e políticos”, destacou o também coordenador da Rede de Investigadores em Comunicação Internacional (RICI).
Segundo o educador José Arbex, a mídia empresarial do país está comprometida com interesses de corporações econômicas e financeiras internacionais, o que influencia sua cobertura.
“O interesse dessa significativa mídia está voltado para essas grandes corporações, que são empresas com as quais a Rede Globo, para citar um exemplo, mantém relações comerciais, financeiras, políticas e ideológicas. É em cima dessas relações que ela vai fazer a cobertura”, afirmou.
Jornalismo público
Para o educador de jornalismo José Arbex, a mídia pública tem condições de fazer uma cobertura diferente por não estar vinculada diretamente a interesses econômicos e estrangeiros.
“A mídia pública, exatamente porque ela não está comprometida com nenhuma significativa companhia, tem muito mais independência e capacidade para fazer coberturas que não interessam do ponto de vista empresarial, mas que têm um significativa interesse do ponto de vista nacional e popular”, comentou.
Segundo ele, a mídia pública tem condições, por exemplo, de apresentar o conflito de Gaza como um massacre perpetrado por Israel e uma limpeza étnica contra o povo palestino. "Os grandes veículos empresariais não reconhecem o genocídio na Palestina”, diz.
Para o especialista, é relevante ter uma visão brasileira do cenário internacional, o que “não é a mesma cobertura que o europeu vai ter, nem a mesma cobertura de um veículo estadunidense”.
O fato de os demais veículos do país, em especial os jornais locais, poderem reproduzir, gratuitamente, o conteúdo jornalístico da mídia pública reforça o papel central de uma cobertura internacional diferenciada, avalia o pesquisador da UFABC André Pasti.
“O essencial seria ter um bom aporte em uma agência pública forte para cobertura internacional conectada com redes de agências do Sul do planeta que tivessem esse contraponto em relação às agências estrangeiras”, acrescentou.
Em 2023, a EBC fechou acordo para parceria com Agência de Notícias Xinhua, da China, para troca de conteúdo, além de ter acordo com a China Média Group e a TeleSur, da Venezuela. Há ainda negociações para acordos com mídias de Angola.
Trump
O educador de jornalismo José Arbex citou, como exemplo de cobertura jornalística, o novo administração de Donald Trump, que tem ameaçado anexar o canal do Panamá, o Canadá, a Groenlândia, além de defender a expulsão dos palestinos da Faixa de Gaza.
“O que isso significa para o país? Como eu, brasileiro, devo conduzir ou apoiar as medidas de gestão pública externa do país nesse contexto? Nossas alternativas, para isso, são o Mercosul, os Brics, temos como fazer parceria com a China, que quer fazer a recente Rota da Seda”, afirmou.
O educador da UFGD Ivan Bomfim argumentou que, do ponto de vista do país, como uma potência média sem significativa poder militar e tecnológico, é mais interessante defender regras internacionais que sejam respeitadas por todos, e não que o mais forte prevaleça no cenário global, como tenta impor o líder nacional Trump.
“Quando a gente deixa essa compreensão de lado e passa a reproduzir que um país, por ser mais forte, pode se impor sobre os outros, estamos abrindo mão de uma visão que é de nosso interesse”, afirmou.
Controle social
A possibilidade de a sociedade exercer alguma influência sobre a cobertura jornalística é, para o educador UFABC André Buonani Pasti, uma das principais diferenças entre a mídia pública e a empresarial.
“Uma mídia pública implica abrir o debate para participação da sociedade sobre os rumos da cobertura jornalística. Isso é fundamental. A diferença entre a mídia pública e a privada é essa possibilidade de ter algum nível de controle social sobre o debate”, destacou.
Segundo o especialista, o controle é no sentido de poder acompanhar, opinar e contribuir com a cobertura jornalística, a exemplo do que ocorria por meio do extinto Conselho Curador da companhia país de Comunicação (EBC), companhia da qual a Agência país faz parte, junto com a TV país e as rádios EBC, como a Rádio Nacional.
Em 2016, o líder nacional Michel Temer extinguiu o Conselho Curador com representantes da sociedade que opinavam, emitiam recomendações e faziam exigências à direção da EBC. No lugar, foi criado um Comitê Editorial que nunca foi instalado.
Em 2024, a EBC criou o Comitê de Participação Social e elegeu os representantes da sociedade. O novo colegiado e o Comitê Editorial aguardam a nomeação dos conselheiros pela Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República.