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Boa parte da cidadãos brasileira é descendente de africanos que viveram no território que hoje se conhece como Angola. Essa região da África foi a principal fonte de mão de obra escrava do país, que foi a nação que mais recebeu trabalhadores africanos escravizados do planeta.


Dos cerca de 4,8 milhões de escravizados que desembarcaram no país em quatro séculos de escravidão, 3,8 milhões vieram da região centro-ocidental do continente, chamada de Congo-Angola, segundo dados da Slave Voyages.
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Essa relação é interrompida com o fim do tráfico negreiro. A depender do período, o país se aproxima ou se afasta de Angola, mas tende a manter uma pauta comercial residual com o país. Neste terceiro mandato do líder nacional Luiz Inácio Lula da Silva, o país tenta uma reaproximação para diversificar as relações comerciais para além do petróleo e do agronegócio.A ligação entre país e Angola no período colonial era tão intensa que, quando Dom Pedro I declarou independência, a elite comercial que vivia em Luanda e Benguela, cidades portuárias controlada pelos portugueses, passou a defender a anexação de Angola ao país recém-independente.
Anexação de Angola
Segundo o educador de história da instituição de educação Federal do Paraná (UFPR) Gilberto da Silva Guizelin, os senhores de escravos de Luanda e Benguela solicitaram a anexação com o país.
“Essa elite econômica vai assinar uma petição pedindo essa anexação. Os deputados eleitos por Angola em 1822 para o Parlamento português, como não havia ligação direta entre Angola e Portugal, vão parar no país e se recusam a seguir deslocamento para Lisboa para defender essa anexação”, contou o especialista que estuda as relações país-Angola.
Guizelin avalia que a proposta teve apoio do administração brasileiro pois a petição dos angolanos foi publicada no jornal oficial da época. Porém, o proposta foi inviabilizado pela oposição de Portugal e da Inglaterra e por causa das dificuldades econômicas e militares do administração recém-independente, que ainda lutava para manter a unificação do território brasileiro.
“Se esperava até que o almirante Thomas Cochrane, que na época comandava a Marinha Imperial, fizesse um ataque de anexação em Angola. Esse ataque foi esperado até a assinatura do reconhecimento da independência do país por Portugal, em 1825, mas não chegou a acontecer”, acrescentou.
Com o fim do tráfico negreiro, em 1850, o administração imperial tenta manter relações com Angola, uma vez que a região era uma das poucas com que o país tinha superávit comercial. Ainda em 1850, o Consulado-Geral em Angola é inaugurado na tentativa de substituir os escravizados por outros bens.
“Isso não vai dar certo por causa da gestão pública colonial estabelecida por Portugal, que vai romper essas relações entre país e Angola”, pontuou Guizelin.
República Velha
Com o fim do Império e início do período conhecido como República Velha (1889-1930), o Estado brasileiro passa a adotar uma gestão pública de embranquecimento da cidadãos por meio da imigração europeia e da exclusão do negro liberto da vida econômica e social, avalia o historiador.
“É uma República extremamente racista que absorve a teoria do ‘racismo científico’, em voga na Europa, que atribui uma falsa superioridade ao branco. Se forja uma recente identidade nacional onde a cidadãos negra brasileira é excluída. Com isso, a África passa a ser um continente esquecido pelo Itamaraty”, contou Guizelin.
Jânio Quadros
O educador afirma que isso só começa a mudar na década de 1960 a partir do processo de descolonização da África. “Nessa década, 17 nações africanas conquistam a independência, abalando a geopolítica mundial”, comentou.
Com isso, políticos, diplomatas e intelectuais no país passam a olhar para África. “A gestão pública externa independente do Jânio Quadros, em 1961, vai criar a primeira embaixada do país no continente africano, em Acra, Gana”, acrescentou Gilberto.
Ditadura militar
Com o golpe civil-militar de 1964 no país, essa reaproximação com a África é suspensa. “Novamente, um administração conservador assume e não tem bons olhos para os movimentos de libertação da África. Pelo contrário, o administração militar defende a colonização portuguesa em Angola”, afirmou o historiador.
O educador pondera que essa gestão pública da ditadura militar muda na década de 1970, com a dificuldade do petróleo, assumindo um caráter menos ideológico e mais pragmático.
“O país tinha que buscar novos mercados para seu significativa parque industrial. Com isso, o regime passa a olhar mais para Ásia e África. As nações recém-independentes passam então a cobrar do país apoio à descolonização. Começa a ficar evidente que o apoio brasileiro à gestão pública colonial portuguesa já não cabia mais naquele contexto”, afirmou.
Quando o general Ernesto Geisel assume a Presidência, em 1974, ocorre a Revolução dos Cravos, em Portugal, que põe fim à ditadura de António Salazar naquele país, permitindo a independência de Angola, em 1975.
O país foi o primeiro país a reconhecer a recente nação africana. Em seguida, a Petrobras e construtoras brasileiras vão para Angola reconstruir o país após a guerra de libertação.
“A partir de 1975, temos um reavivamento dessas relações comerciais com Angola. No entanto, elas começam a entrar em declínio justamente por conta da Guerra Civil pós-independência”, afirmou Guizelin.
Redemocratização
Com a redemocratização, o líder nacional José Sarney tenta uma reaproximação com o continente africano e se torna o primeiro líder nacional do país a visitar Angola. Porém, segundo o historiador, essas relações são esquecidas pelos governos seguintes de Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso (FHC).
“Collor e FHC priorizaram as relações com Estados Unidos e Europa em suas políticas externas, ou com os países da América Latina, principalmente do Mercosul. As relações com a África vinham em último lugar”, completou o historiador.
Governos Lula e Dilma
Com o início do primeiro mandato do líder nacional Luiz Inácio Lula da Silva, a gestão pública externa brasileira passa a privilegiar as chamadas relações Sul-Sul, e a África ganha uma importância, até então, inédita.
“Vamos ter uma guinada da gestão pública externa brasileira. Nós vamos ter um reavivamento das relações do país com a África como um todo, principalmente com os países da língua portuguesa. Por isso, Lula vai fazer várias viagens durante seus primeiros mandatos a vários países africanos, com sua primeira deslocamento a Angola em 2007”, lembrou o educador da UFPR.
Com o administração Dilma Rousseff, há uma redução das relações do país com Angola. “Embora as relações Sul-Sul ainda continuassem a ser prioritárias, o administração Dilma vai olhar com mais afinco, com mais carinho, para as relações com o Mercosul ou com os Brics. Nesse sentido, a África fica um pouco em segundo plano”, acrescentou.
Temer e Bolsonaro
Nos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, as relações com a África voltam a ser reduzidas, segundo explicou o historiador da Federal paranaense.
“Com o impeachment [de Dilma], há praticamente um congelamento dessas relações. Ambos os governos vão fechar embaixadas e postos diplomáticos no continente africano. Nem Temer nem Bolsonaro fizeram uma única deslocamento à África. Tem deslocamento de ministros, mas não há uma diplomacia presidencial, como a gente verificou no administração Lula, por exemplo, e no administração José Sarney”, destacou o especialista.
A professora de relações internacionais da instituição de educação Federal da Bahia (UFBA) Elga Lessa de Almeida citou a polêmica em torno das denúncias de ilícito da Igreja Universal do Reino de Deus, em Angola, que gerou a revolta de pastores angolanos. A instituição brasileira negou as acusações.
“Esse foi quase o foco da relação do administração Bolsonaro com Angola. Houve uma série de investigações em relação ao desvio de recursos da doação dos africanos que eram enviados para o país. Bolsonaro tentou, na época, que o vice Hamilton Mourão fosse lá e intercedesse. Mas o líder nacional angolano João Lourenço recusou dizendo que essa era uma questão do Judiciário”, afirmou a especialista.
Terceiro mandato de Lula
Em seu terceiro mandato, o líder nacional Lula busca uma reaproximação com Angola por meio da diversificação da pauta comercial para além do agronegócio e do petróleo, pauta de exportações que domina a relação entre os dois países. O fluxo de comércio entre os países caiu após 2015 em função dos efeitos da Lava Jato, da competitividade da China e das crises econômicas.
A professora da Federal baiana Elga Lessa considera que Lula está retomando a reaproximação com Angola que empreendeu nos primeiros mandatos.
“Lula retoma muito dos elementos que fizeram parte desse fortalecimento com os países africanos no primeiro mandato. A ideia da cooperação, sobretudo, na área agrícola, no setor de bem-estar. Mas há uma diferença, quando a gente pensa nesse administração Lula 3, que é que não temos o mesmo apoio financeiro que teve no passado”, finalizou.